Primaverou

casa

Tua ausência me passeia.
Visita corredores úmidos
imunes à luz.
Percorre compartimentos
há tanto inúteis.
Não há lugar
em que tua presença
se manifeste.
Vestígios de ti
se esgarçam.
Tua ausênia busca
nos jardins de mim
sementes
que te denunciem.
A primavera
te invalida
para sempre.

Bebedeira

s.majuri

Suzanna Majuri

Quero embebedar-me
de mar.
Andar trôpega
por suas espumas
lançar o corpo
tonto
em suas marés.
Quero embebedar-me
de mar
perder a lucidez
até naufragar-me.

memória da infância

Mary Cassat

Mary Cassat

Hoje sei
um pouco mais
de mim.
Sou mar
navego
sou barco
sou pedra
sou ponte inútil
que ninguém
trafega.
Sou ilha perdida
quase no fim
do mundo
Sou fruta
da chácara
sou filha da terra
abandonada.
Sou saudade
de um mar insano
que me faz
viver mareada.

Guloseimas

d.dmitriev

Como quem mastiga
caramelos
mordo os instantes
Como um mergulhador
que busca os corais
respiro profundamente.
Tudo é mágico
e o mundo gira
qual roda-gigante.

ALELUIA

Genute Burbaitè

Genute Burbaitè

Expulsa a tristeza

que se hospedou

em mim

rasga os véus

de saudade que

colaram minhas retinas

lava esse gosto

de passado

que cobriu minha pele

– preciso renascer!

Inutilezas

Dima Dmitriev

Dima Dmitriev

Conselhos

aplausos

elogios

promessas?

Poupem-me!

Nada disso

me apraz.

Meu tempo é escasso

vou ouvir o riso

rouco do vento.

Aprender o dialeto

das andorinhas

e ensaiar

o balé russo

das nuvens.

Não me ocupem

com inutilezas.

Entrega

Elena Shlegel

Elena Shlegel

Eu vi o vento

ele me viu

e a correr

enlaçou meu corpo

moído de ausências.

Eu vi o mar

eterno amante

e ele, ao me ver

rompeu barragens

e alagou avenidas

só para aguar

minha alma

macerada de escamas.

Eu segui o vento

eu me dei ao mar.

Nudez

onda Mesmo que eu me despisse me despojasse de todos os adereços e enfrentasse o mundo com minha nudez, ainda assim o mar me cobriria.

dá-me teus braços

janelas pro mar

Dá-me teus braços
gélidos
dispersos
ampliados
até a linha
do universo.
Dá-me teu colo
úmido
escuro
continente
capaz de caber-me
no seu mais fundo.
Dá-me tua lágrima
ácida
salgada
ardente
para que choremos
juntos
eternamente.

Mítico ser e múltiplos disfarces!

Nunca nadei
num mar de rosas.
Amalgamei
cores ao rosto
difícil achar
o essencial.
Mimetisei-me
nos galhos,folhas,
sementes abortadas
adquiri propriedade
do obscuro
e descobri a fórmula
do invisivelmente.
Ofensas não mais
me acham
abates, eu lhes escapo
driblo tropeços
brinco de esconde-esconde
com as intempéries.
Não sendo nada
posso ser tudo.
michael cheval